Anderson T. Santos Não raro vemos circular nos aplicativos de mensagens ou redes sociais diversos textos que pretendem esclarecer situações delicadas do nosso cotidiano ou discorrer sobre a tão mencionada “transição planetária”. Vários deles são assinados por espíritos conhecidos e respeitados no meio espírita. Sem querer entrar no mérito de qualquer mensagem em específico, é sempre válido relembrar a postura de Kardec frente ao intercâmbio espiritual, uma vez que a ânsia por respostas pode nos fazer abrir mão de uma análise adequada, nos expondo a confundir fantasias com verdades. Sabemos que os espíritos pertencem a humanidade. Não são seres à parte da criação. A diferença entre encarnados e desencarnados é que estes últimos não possuem mais corpos feitos da mesma matéria que os nossos (ver O Livro dos Espíritos, Questões 134 a 135a). Nesse contexto, é importante ter em mente que, após a morte do corpo físico, o espírito se encontra tal qual se fez até aquele ponto. Por conseguinte, se em nossa vida de relação encontramos mulheres e homens íntegros, sábios, mas também aqueles que são levianos, não confiáveis, do outro lado da vida encontraremos as mesmas virtudes e imperfeições (ver O Livro dos Espíritos, Escala Espírita). Em outros termos: A morte, em si mesma, não transforma ninguém em “santo” ou “detentor de todos os conhecimentos do universo”. Baseado nesse raciocínio, pare por 10 segundos e responda mentalmente a seguinte pergunta: é prudente acreditar em qualquer mensagem vinda dos espíritos? Vejamos o que que Kardec diz a esse respeito: “O Espiritismo veio revelar uma outra categoria, bem mais perigosa, de falsos cristos e de falsos profetas que se acham, não entre os homens, mas entre os desencarnados: é a dos espíritos enganadores, hipócritas, orgulhosos e falsos sábios que, da Terra, passaram para a erraticidade, e se utilizam de nomes venerados, para procurar, valendo-se da máscara com que se cobrem, fazer com que deem crédito às suas ideias, muitas vezes as mais bizarras e as mais absurdas.” (O Evangelho Segundo o Espiritismo, Capítulo XXI, item 7) “(...)Espíritos hipócritas insinuam, com habilidade e uma perfídia calculada, fatos inventados, afirmativas mentirosas, a fim de enganar a boa-fé de seus ouvintes. Deve-se, portanto, retirar, sem piedade, qualquer palavra, qualquer frase equívoca e só conservar do ditado o que a lógica aceite ou o que a Doutrina já ensinou.” (O Livro dos Médiuns, Capítulo XX, item 230) Logo, a resposta para a pergunta feita acima é “Não”. Em torno das mensagens é preciso considerar também que nenhum médium está isento de eventualmente ser iludido, pois todos nós que encarnados na Terra somos falíveis. Pelo que que foi exposto até aqui, nenhum nome conhecido, seja de um espírito ou de um médium, deve comprometer a criticidade que devemos ter sobre as mensagens espirituais que chegarem até nós. Nenhuma comunicação dos espíritos é “inquestionável”. Tratá-las como algo “imaculado”, porque tem uma assinatura que estimamos ou porque veio através de um médium respeitado, desconsiderando o conteúdo, é um erro. Tenhamos atenção com essa forma imprudente de lidar com o intercâmbio espiritual e que nada tem a ver com as recomendações de Kardec. Os espíritos sérios e verdadeiramente comprometidos com nosso esclarecimento não se incomodarão se formos críticos. Pelo contrário, na própria codificação existem recomendações para esta postura perante as mensagens. Nos assevera Erasto: “(..) Na dúvida, abstém-te”, diz um de vossos antigos provérbios; não admitais, portanto, senão o que seja para vós de uma evidência patente. Desde que uma opinião nova se apresente, por menos que vos pareça duvidosa, passai-a pelo depurador da razão e da lógica. (O Livro dos Médiuns, Capítulo XX, item 230).
Uma vez a razão nada encontrando de ilógico nas mensagens, Kardec nos recomenda, ainda, uma outra estratégia: Checar a opinião de outros espíritos sobre o mesmo assunto. É o que se chama de “Controle Universal do Ensino dos Espíritos” (ver O Evangelho Segundo o Espiritismo, Introdução, item II). Se um espírito traz uma informação completamente nova e de relevância geral, manda a prudência que se aguarde a confirmação. Se for uma verdade e houver chegado o momento propício de sua divulgação, outros espíritos a repetirão espontaneamente, por médiuns distintos, estranhos uns aos outros e em diversos lugares. Até que isso aconteça, admite-se o ensino dado como opinião pessoal daquele espírito e não como algo sancionado como verdade. Assim sendo, reflitamos: Aquelas mensagens que recebemos e compartilhamos nos aplicativos e redes sociais, se propondo a dar as explicações e soluções das mais variadas para os problemas da humanidade, passaram pela crítica? Pelo crivo da lógica? Da ciência? Foram sancionadas pela da comunicação de outros espíritos? Seguindo essa linha de raciocínio, somos levados a concluir que certas mensagens de espíritos, difundidas através dos meios tecnológicos, podem se tratar apenas de ficções. Tais textos são muitas vezes bem construídos, porém sem valor prático para nosso esclarecimento. Quando divulgamos conteúdos assim, sem a perspectiva da dúvida e da análise, contribuímos para dificultar o esclarecimento geral, uma vez que um ruído fantasioso se espalha e muitas vezes se instala nas mentes das pessoas. Logo, estejamos sempre em estado de alerta frente às comunicações dos espíritos. Essa será a melhor maneira de nos instruirmos e de auxiliarmos os outros a se instruírem também. Vale dizer que este texto não tem a pretensão de esgotar o assunto, já bastante trabalhado na codificação espírita, mas apenas oferecer uma breve reflexão sobre o compartilhamento de mensagens dos espíritos na atualidade. Para maiores detalhamentos e aprofundamento das reflexões aqui abordadas, recomenda-se consultar a literatura reportada nesse artigo. Bibliografia: KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. 2a Edição. Rio de Janeiro: Editora Leon Denis, 2011. KARDEC, Allan. O Livro dos Médiuns. 1a Edição. Rio de Janeiro: Editora Leon Denis, 2009 KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo. 5a Edição. Rio de Janeiro: Editora Leon Denis, 2009
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