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Sobre o óbvio: Posicionamento sobre os desdobramentos do caso de uma menina estuprada

Quando as obviedades da religião que seguimos fazem com que o mais importante seja impor a minha verdade ao outro, algo está muito errado. O que deveria ser manancial de equilíbrio e paz se transforma em fonte de arrogância e sofrimento. Daí, os religiosos se tornam “semelhantes aos sepulcros caiados, que por fora realmente parecem formosos, mas interiormente estão cheios de ossos de mortos e de toda a imundícia” [1]. Além disso, Jesus veio e disse algo ainda mais óbvio: “Aqueles que me dizem: Senhor! Senhor! não entrarão todos no reino dos céus; entrará apenas aquele que faz a vontade de meu Pai que está nos céus” [2], mostrando a hipocrisia de alguns.


A menina de 10 anos começou a ser estuprada com 6 anos. Do próprio tio. Engravidou. Foi chamada de assassina por religiosos católicos e evangélicos. Espíritas, utilizando recortes dos livros de Allan Kardec, também acusam e atacam a menina de 10 anos que começou a ser estuprada com 6 anos. E foi colocada em segundo plano.

Ou seja: o caso tratado deveria ser o estupro de uma criança, mas o transformaram para que a culpa, de forma óbvia, caia sobre a criança-mulher.


Diante desses desdobramentos afirmamos que é urgente que os espíritas debatam violência doméstica, aborto, feminismo, direitos sociais e tanto outros temas, não com a cabeça de alguém do século XIX, mas realizando paralelos sociais atuais.


Nas casas espíritas, em seus estudos, não deveriam existir "tabus". Mas por atavismo religioso – e a lei de reencarnação auxilia o entendimento desse fenômeno – dificulta as tentativas de diálogos francos, onde o objetivo seja o crescimento intelectual e a emancipação dos seres. Por essas dificuldades certos temas são abafados por um silêncio constrangedor, impedindo qualquer debate de ideias com capacidade de crescimento geral. Assim, ainda é preferível, em muitos núcleos espíritas, a falsa paz, que dá uma sensação de segurança, mas que não passa de estruturas fincadas em areia.


Para os que estão sinceramente mais preocupados com o destino do bebê, ignorando toda a problemática da situação, indicamos a resposta dos espíritos, em O Livro dos Espíritos, onde fica claro que, em situações onde a gravidez gere riscos de morte para a mãe, “preferível é se sacrifique o ser que ainda não existe a sacrificar-se o que já existe.” [3]


Ora, ser mãe precocemente tem riscos de saúde, como: bebê com baixo peso, falta de ferro e anemia profunda, pressão alta. E ainda existe o risco e a dificuldade durante o parto, por se tratar de uma estrutura óssea infantil e ainda não desenvolvida completamente, impossibilitando a passagem do bebê no canal vaginal, tendo que apelar para uma cesárea de emergência [4].


Ainda, em adolescentes sem nenhum tipo de planejamento nem apoio familiar, a gravidez ocasiona diversos problemas na vida da gestante e perpetua um ciclo de pobreza e exclusão social difícil de ser quebrado. Adolescentes pobres têm cinco vezes mais risco de engravidar que as mais ricas. Com filhos, dificilmente elas conseguirão conciliar os estudos, entrar no mercado de trabalho e ter independência financeira [5]. Agora, imagine essas questões postas para uma menina de 10 anos.


Dados do Ministério da Saúde (2018) [6], dizem que 42% das crianças e adolescentes que sofrem abuso sexual são vítimas recorrentes; 72% das pessoas estupradas são menores e 18% têm até 5 anos. A cada dez crianças e adolescentes que são atendidos no serviço de saúde após sofrerem algum tipo de violência sexual, quatro já tinham sofrido esse tipo de agressão antes.


Por fim, gostaríamos de ver um movimento espírita dando apoio material e espiritual para as mulheres e meninas que passam por essa situação; demonstrando empatia, sofrendo junto, ampliando o debate dentro das casas espíritas, nos grupos de estudos.


Que Jesus possa auxiliar na superação das obviedades atuais e que todos nós percebamos, verdadeiramente, uma obviedade ainda mais óbvia: “Filhinhos, não amemos de palavras nem de boca, mas sim de atitudes e em verdade.” [7]



[1] Mateus, 23: 27.

[2] Mateus, 7: 21 a 23.

[3] KARDEC, Allan, O Livro dos Espíritos, q. 359, kardecpedia.com

[7] João, 3:18.


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